Em 1989, o verão era um caldeirão de aventuras e mistérios. As ruas
fervilhavam com a energia dos jogos de futebol e o eco das risadas infantis. O
cinema, porém, era uma joia rara, especialmente para nós, um grupo de amigos
unidos pela sede de descobertas. O Shopping Iguatemi, em Salvador, era uma miragem distante, um paraíso
cinematográfico que nossos bolsos vazios não podiam alcançar com suas salas de cinema sensacionais. Mas tínhamos o
nosso próprio refúgio: o Cine Teatro de Lauro de Freitas, com exibição de filmes
brasileiros antigos, a maioria restritos
para a nossa tenra idade.
Durante aquele verão memorável, a Base Aérea abriu seus portões para a
comunidade, como era de costume neste período de férias. E foi lá que, pela primeira vez, assistimos a
clássicos como "E.T." e "Indiana Jones", imersos em um
mundo além da nossa imaginação.
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Cinema da Base Aérea de Salvador |
Numa tarde quente, a novidade surgiu: haveria uma sessão especial de
"De Volta para o Futuro" na Base. Com corações palpitantes, nos
reunimos eu e alguns amigos, no portão principal, um limiar entre uma noite cultural, recepcionados por soldados armados, que nos dirigiram até um ônibus que nos levou ao antigo cinema de poltronas de madeira e uma ampla sala preservada com ar de anos 60.
O filme foi uma viagem mágica, mas a verdadeira aventura começou no
final, quando as luzes acenderam. A notícia que os soldados nos deram, era que não teria ônibus para nos levar de volta ao portão da
Base, que fazia fronteira com a nossa cidade. Enfim, teriamos que caminhar cerca de dois quilômetros. Nos vimos diante do desafio de
retornar a pé, uma jornada que nos levaria perto da infame mangueira
assombrada. Algo que arrepiava só de pensar.
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Ilustração | Jones Carvalho
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Os mais velhos contavam histórias de almas perdidas que rondavam a
mangueira após o anoitecer. E lá fomos nós caminhado sob as luzes oscilantes
dos postes, que piscavam, parecendo ganhar vida e cada sussurro do vento carregava segredos amedrontadores.
Quando nos aproximamos da velha árvore, um grito cortou a noite. Uma
grande coruja branca voou sobre nós, seu berro estridente ecoou como um aviso.
Nossos passos se transformaram em uma corrida desenfreada, cada batida do
coração um compasso de terror e excitação. O medo tomou conta de todos!
Após chegarmos ao portão, tínhamos outro obstáculo, o mais temido: o
velho cemitério da Igreja Matriz, morada da lendária "Mulher de
Branco". As histórias de seu espírito vagando pelas ruas à noite eram
conhecidas por todos. Com respirações ofegantes e risadas nervosas,
atravessamos a escuridão, cada sombra era uma ameaça, cada movimento um
mistério.
Ao fim daquela noite, exaustos, mas inteiros, chegamos a nossas casas.
As portas se fecharam atrás de nós, mas as histórias daquela noite
permaneceriam conosco, como sussurros de uma aventura que só Lauro de Freitas
poderia proporcionar. Aquele verão se tornou uma lenda entre nós, entre penumbra, ecos
e descobertas, sob o céu estrelado de uma cidade repleta de histórias para
contar...
Preservação da memória
Através dessas narrativas, passadas de geração em geração, Lauro de
Freitas não apenas preserva seu rico patrimônio da cultura popular, mas também reafirma
sua singularidade na história do Brasil. Esses contos, vividos e compartilhados, destacam a importância de uma
literatura que se alinha com as raízes e o espírito da cidade. Eles não são
apenas instrumentos de entretenimento, mas ferramentas educacionais valiosas
que incentivam a comunidade a explorar e a apreciar seu legado cultural. Ao
promover essa conexão com o passado e com as lendas locais, Lauro de Freitas
não só enriquece sua literatura, mas também fortalece a educação,
proporcionando aos moradores uma compreensão de pertencimento com o município.
Autor:
"A mangueira assombrada"
Márcio Wesley
Jornalista | MBA em Comunicação e Semiótica | Lincenciatura em Artes Visuais.
Maravilha Wesley. Parabéns
ResponderExcluirRapaz que coisa linda você trouxe o nosso passado ao nosso presente,nois vivimos tudo isso valeu irmão parabéns pelas lembranças Deus abençoe você e sua família amém 🙏
ResponderExcluirMassa!!! As estórias de assombração desapareceram do imaginário das crianças!! Bons tempos. Ouvia muitas da minha mãe.
ResponderExcluirMuito massa. Rsrs Lembrei das 3 casinhas lá em Belém de Cachoeira, no recôncavo, que também têm fama de serem mal-assombradas. A gente sempre passava correndo. Rsrs
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