Lauro de Freitas: 63 anos de emancipação e memórias soterradas
Por Márcio Wesley
No próximo 31 de julho, Lauro de Freitas completa 63 anos de emancipação política. Um marco que nos obriga a lembrar que antes de virar cidade, nossa velha Santo Amaro de Ipitanga já era centenária e carregava um pertencimento que, ainda hoje, luta para não ser apagado.
Em 1608, nasceu oficialmente a Freguesia de Santo Amaro de Ipitanga, com a construção da igreja dedicada a Santo Amaro, santo português que deu nome à vila.
Mas antes do catolicismo chegar, quem nomeou o território foram os povos originários: Ipitanga, na língua tupi, significa “água vermelha”, referência à cor ferruginosa dos rios que cortam essa terra.
A Freguesia era extensa, chegava a alcançar partes que hoje pertencem a outros municípios, até a divisa com Sergipe em algumas versões de registros históricos. Mesmo assim, no século XX, Santo Amaro de Ipitanga era apenas um distrito esquecido de Salvador. Sem postos de saúde, sem transporte digno, sem luz elétrica, água encanada ou ruas calçadas. Uma vila humilde, longe dos olhares dos políticos e governo.
Foi nessa carência que nasceu o desejo de se emancipar. Salvador não queria abrir mão de suas terras, mas também não oferecia condições mínimas para quem vivia por aqui.
A solução política apareceu com um nome novo: Lauro de Freitas, engenheiro e político baiano que morreu tragicamente em 1950, num acidente aéreo enquanto disputava o governo do Estado.
O nome foi escolhido como homenagem, ou melhor, uma estratégia. Mas para o povo da vila soou como imposição. A história viva, gravada em Santo Amaro de Ipitanga, foi trocada por uma placa nova, decidida de cima para baixo e sem a participação dos moradores.
Salvador ficou com parte de nossas terras e com o aeroporto, que desde 1925 já era chamado de Campo de Pouso de Santo Amaro de Ipitanga. Um pedaço da nossa história que foi renomeado e oficialmente incorporado à capital, apesar de geograficamente estar também dentro de nosso território.
Hoje Lauro de Freitas ocupa pouco mais de 50 quilômetros quadrados, abriga mais de 200 mil habitantes, e continua lidando com problemas que lembram os tempos de vila: falta de mobilidade, saneamento deficiente, ruas que sofrem para acompanhar o crescimento desordenado. E, sobretudo, uma memória histórica que se perde, sem políticas públicas que cuidem dela.
Câmara municipal
Em 1962, meu avô, Jaime Nery, juiz de paz, foi quem deu posse aos primeiros vereadores da cidade. Sessenta e três anos depois, temos uma Câmara Municipal que não honra sua própria fundação.
Demoliram a antiga sede na Praça da Matriz em 2022 prometendo uma nova que até hoje não existe nem no papel. Hoje nossos representantes ocupam salas alugadas, longe da grandiosidade que Lauro de Freitas merece.
Em mais de quatro séculos, essa terra viu tudo: a luta dos povos originários, o trabalho do povo negro escravizado, a resistência na Independência da Bahia, o sonho da autonomia.
Temos histórias que dariam um museu inteiro, mas ainda não temos um. Por isso, resistir é lembrar. E lembrar é lutar para que, mesmo que tenham nos tirado o nome, não nos roubem de nós mesmos as raízes, memórias e a históricidade do povo Ipitanguense.
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Márcio Wesley | DRT/BA 5469
Jornalista | MBA em Comunicação | Licenciado em Artes
Lauro de Freitas: 63 anos de emancipação e memórias soterradas
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julho 14, 2025
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Muito bom lembrar a história, para construirmos um futuro próspero. !
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