Diretor teatral cubano Luís Alonso - "Lauro é rica culturalmente"
No Brasil inventaram uma esquerda que desconhece o que acontece em Cuba ou se fazem de cegos...
Luis Alonso
O nosso papo é com um amigo Cubanobrasileño, graduado na Escola Nacional de Teatro de Cuba e mestre em Artes Cênicas pela Universidade Federal da Bahia, estou falando do diretor e ator Luis Alonso, 47 anos. Acho que conheci Alonso entre 2007 e 2008, numa oficina de teatro que ele ministrou aqui em Lauro.
Na época
ecoou um burburinho interessante e Duzinho meu irmão, que era apaixonado por
teatro me contou eufórico, “tem um diretor cubano dando uma oficina
interessante, você precisa conhecê-lo, ele é massa e suas aulas são incríveis”.
Fui ver de perto e fiquei realmente admirado. Um cara inovador, cheio de
energia, atitudes progressistas e fugindo das eventualidades postas pela arte
convencional. Pensando à frente e fora da caixinha!
Alonso faz parte do time dos divisores de água cultural aqui nas terras de Ipitanga. Inquestionávelmente seu legado foi absorvido por nossa gente e muitos grupos culturais até hoje compartilham esse precioso intercâmbio.
O teatro é um movimento que apesar de viver sob uma espécie de manto absorto, comparado aos outros gêneros culturais, perdura bravamente. Infelizmente nos deparamos (desde sempre) com a larga lacuna faltosa de incentivos.
Apesar dos contratempos a cortina teatral perdura escancarada, sorrindo e persistente diante das tempestades.
O mestre Alonso nasceu em Cuba e há 18 anos reside no Brasil, para nossa alegria desembarcou aqui na Baia de Todos os Santos. Uma figura massa, criativa, inteligente e sem papas na língua. Sabe bem a dor de viver em um país que precisa avançar em inúmeros processos, assim como a gente na “Terra Brasilis”. Mas ele ama sua pátria e tem orgulho de ser cubano.
Não esconde sua paixão pelo Brasil e pela nossa gente. Posso assegurar que Luis carrega na sua alma a pluralidade brasileira. Se adaptou com os nossos costumes, que são muitíssimos parecidos com os da sua terra mãe.
Um agente cultural que voa incansável como um andorinhão, sem medir esforços para deixar fulgente a arte como processo evolutivo da humanidade. Com suas produções nos incentiva a persistir, mesmo que nos pareça inviável, insuportável, enlouquecedor.
A arte é a esperança que mantém a humanidade contrabalançada. Sem arte seríamos
seres de alma pálida, desiludida, embaçada, sem luz. Vamos avante com uma entrevista que fiz pelo WhatsApp com o nosso querido Luís Alonso.
Relação com Lauro de Freitas...
Em Lauro de Freitas criei junto com meu parceiro Rafael Magalhaes, o Oco Teatro Laboratório. Funcionamos em Lauro durante seis anos. A ausência de apoios proporcionou a nossa saída da cidade, infelizmente.
Foi graças a Lírio e Emanuela, gestores da Secretaria de Cultura (na época), que
conseguimos trabalhar durante os primeiros anos, mas não foi nada fácil, o
projeto não foi levado com a prioridade que merecia pela gestão. Mas fizemos o
que era possível, foi um período muito produtivo e de troca de conhecimentos
com os artistas e a comunidade.
Cultura laurofreitense...
A nossa interação com os artistas de Lauro era muito interessante. Há nesta cidade um potencial artístico enorme. Mas infelizmente voltamos sempre com a falta de dedicação e sensibilidade das políticas públicas, que precisa compreender que a arte é indispensável para o crescimento humano e de toda uma sociedade. Tão importante quanto educação, saúde e segurança pública, por exemplo.
Eu tenho uma pergunta guardada comigo para os políticos de todos os partidos. "Será que interessam aos senhores e senhoras uma sociedade que pensa e debata as suas subjetividades?"
Há em Lauro de Freitas um potencial artístico enorme...
Produções nas terras de Ipitanga
Em Lauro surgiu Oco Teatro Laboratório e dele tivemos muitos frutos a exemplo do Festival
Internacional Latinoamericano de Teatro da Bahia – FilteBahia; Núcleo de
Laboratórios Teatrais do Nordeste – NORTEA; A revista especializada em artes cênicas 'Boca de Cena'; Três espetáculos que viajaram pelo Brasil, Estados
Unidos e Espanha, além de inúmeros projetos de formação nas comunidades.
Infância e juventude...
Um período de muito estudo onde a gente normalmente segue o fluxo da vida, pensando na formação e preparação para o futuro.
Somente quando adulto é que conseguimos refletir sobre o passado iminente. Tive
uma infância e juventude cheia de sonhos em um país de governo comunista que
nos decepcionou e mantém uma ditadura que perdura mais de 60 anos.
Desde criança essa experiência me levou a sentir a arte como parte da minha existência...
Começo da caminhada...
Meus irmãos me transformaram desde
pequeno em um boneco. Eles tinham 10 e 9 anos na minha frente. Aí começaram a
trabalhar comigo onde eu imitava um boneco e atuava com eles em festivais. Era
muito divertido. Desde criança essa experiência me levou a sentir a arte como
parte da minha existência.
Cuba...
Cuba? Hoje não sinto saudade de nada, apenas da minha família e amigos. Já senti saudade da música, da arquitetura e da vida em Cuba. Mas o próprio sistema opressor de lá me fez sentir vontade de não sentir nada. A política em artes cubana é totalmente controlada pelo governo centralizador.
Tive uma infância e juventude cheia de sonhos em um país de governo comunista que nos decepcionou...
A censura está de volta e cada vez pior. As diferenças são muitas. Primeiro aqui no Brasil inventaram uma esquerda que desconhece o que acontece em Cuba ou se fazem de cegos, o que seria pior no meu entendimento. Levantam bandeiras defendendo uma ditadura como a cubana, uma coisa muito doida.
A esquerda no Brasil precisa se reinventar, de qualquer maneira não parece em nada ao governo cubano. Embora exista no Brasil uma censura solapada, mas não é igual ao governo cubano com mais de 60 anos de ditadura.
Importante dizer que sou um cidadão com pensamentos de
esquerda.
Saindo da ilha...
O amor fez com que eu saísse da ilha. Mas depois que decidi viver no Brasil me proibiram de entrar em Cuba por 14 anos. Imagine 14 anos sem você poder entrar na casa de seus pais? Ainda tem malucos que defendem este tipo de atitude.
Eu já desejei para toda pessoa que defende o sistema cubano, que em seu pais também tivesse uma ditadura de 62 anos. Essa é a única forma de deixarmos de ser alienados e acordarmos para a realidade.
Cuba é uma ditadura ferrenha que engana o mundo com sua máquina de
propaganda de saúde e educação gratuita. Todos os cubanos de dentro e de fora,
pagam um preço muito alto pela aquisição desses serviços, que na realidade são precários.
Precisa mudar...
Primeiramente ter a liberdade para o povo escolher seu presidente ou presidenta, de forma direta e com diversos partidos. Não podemos ter somente o Partido Comunista de Cuba (PCC) na gestão nacional.
Cuba
precisa recuperar a sua liberdade e o restante virá no percurso da vida na
ilha. O país precisa recuperar a sua memória, memória que o governo repressor
desvirtuou.
E o Brasil?
É um país com expressões tão belas e
potentes. As vezes tenho a sensação de que não falta nada, mas talvez isso faça
a diferença. Um bom sistema educacional com certeza melhoraria tudo.
Durante a pandemia...
Escrevi a minha dissertação do mestrado que foi publicada pela editora Giostri de São Paulo. O livro se chama “Corpo zero, energia e presença na construção do corpo teatral". Correr todos os dias 14 quilômetros e tentar subsistir.
Neste período consegui me olhar mais adentro. Me compreender como ser humano em relação ao meu entorno e ao meio ambiente do qual fazemos parte. Me sinto privilegiado por estar vivo.
Cuba precisa recuperar a sua liberdade
Agradecimentos...
Agradeço à vida por ter me dado a oportunidade de seguir vivendo em um país que me acolheu e me deu a possibilidade de manter meus sonhos profissionais, como homem livre. Viva ao Brasil!
Dizer que estou muito sentindo com a partida precoce do nosso querido Duzinho Nery, uma figura brilhante, uma mente pensante que amava Lauro de Freitas e o teatro.
Eu gostava muito de seu irmão (Duzinho) a gente sempre dava boas risadas, ele era uma pessoa sensacional. Uma figura relevante que movimentava a cultura da cidade.
Força no coração para que possamos seguir em frente lembrado sempre dele como uma pessoa alegre, proativa e um dos maiores gestores culturais de Lauro de Freitas.
Márcio Wesley | DRT/BA 5469
Jornalista com MBA em Comunicação
e Semiótica na linguagem artística
Figura importante para a cultura teatral de Lauro de Freitas, contribuiu muito, fiz aula de dança afrocubana no terminal turístico de portão nós meados de 2005 pra 2008 e a experiência foi muito boa...Na época tinha na turma, os saudosos Edson oliva e Duzinho Nery, como também os contemporâneos Vinícius coelho Andréa Mota Renato Lima entre outros... não vou dizer que foi um tempo bom, porque a política era muito suja, a cultura era explorada por urubus, mas no que se diz respeito a arte Alonso salvou, a arte salva,liberta e é continua.
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