ITINGA, ORGULHO DE SER DE LAURO DE FREITAS
Foto Márcio Wesley | Largo do Caranguejo
Quando dona Joana do Nascimento, 300 anos atrás, na primeira metade do século XVIII, era a proprietária do sítio denominado Itinga, longe estaria de imaginar que suas terras um dia se transformariam num aglomerado urbano de quase cem mil almas - como se dizia na época - e alvo de cobiçada disputa judicial pelo valor que agregam, tanto do ponto de vista econômico, quanto político. Quando subimos hoje, do Largo do Caranguejo em direção ao Parque Santa Rita, ainda podemos ver do lado direito, o último fogo, ou casa, como chamamos hoje, que serviu de sede do sítio, onde moravam, até relativamente pouco tempo, os últimos proprietários, os irmãos Antônio Pedro, Gabino e Da Hora, que moradores ainda vivos conheceram, pelo menos o Da Hora, o último a falecer.
Ilustração de um engenho de açúcar | Brasil colonial |
A paisagem formada por esses e outros sítios circunvizinhos e terras remanescentes dos vários engenhos que existiam na outrora freguesia de Santo Amaro de Ipitanga, a exemplos do Engenho Mussurunga, de Bernardino Marques de Mussurunga, que foi também o primeiro Juiz de Paz da velha freguesia e do Engenho Cají de propriedade do poderosíssimo Coronel Ladislau, não se alterou em quase nada até o início da segunda metade do século XX, com não muito mais do que a existência de rios, córregos, lagoas, muita mata e animais de pasto ou de outras espécies, como cobras, jacarés, pássaros em profusão, dentre outros.
A partir do início da década de 1970, há menos de meio
século, portanto, é que fugindo da especulação imobiliária, do já aumento dos
índices de violência em Salvador ou atraídos pela possibilidade de emprego em
algumas das indústrias, que passaram a se instalar na Região Metropolitana: Petrobrás,
Tibrás e as do CIA e do Polo Petroquímico de Camaçari, moradores da periferia
da capital, começam a migrar em direção ao Litoral Norte. Juntando-se a esses,
gente de outras cidades e estados em busca também de sossego e estabilidade
econômica começam a chegar.
Imagem da internet | Blog Itinga: conheça e se encante pelo meu bairro http://historiadelauro.blogspot.com/2012/ |
A Itinga se torna então, o maior retrato desse fenômeno
migratório. Em 1973, o Babalorixá Pai Cezar e o artista plástico Nivaldo
Portela chegam a Itinga e juntam-se a outros pioneiros: Maninho, Ozanias Leal (pai do comunicador e blogueiro Ladislau Leal), João
Oliveira, Professora Fátima, Antônio Caranguejo, Lourinho do fato, Mestre
Sérgio, a família de Paulo Aquino e muitas outras que foram
"desembarcando".
Em 1983, os já citados Pai César, Portela, Grande
Conceição, José Vicente, Tonzé, Tânia Maria, Narciso e outros festeiros
resolveram organizar os blocos Olodum Odé e Nagazumbi, que por falta de maior
apoio não lograram êxito. Em compensação inventaram a Festa do Caranguejo que
chegou pra ficar. Essa festa, cujo nome se reporta ao primeiro largo do então
nascente bairro, cujo topônimo imortalizaria Seu Antônio Caranguejo, assim
apelidado pela sua atividade de venda dos crustáceos nessa localidade,
atividade essa que trouxe do alto da Santa Cruz, extensão do Nordeste de
Amaralina, que cresceu e virou bairro, aonde residia e comercializava sua
mercadoria, no Bar do Caranguejo.
Imagem da internet |
Antônio Caranguejo e Lourinho do fato com seus simples
pontos de venda foram assim os pioneiros de um dos mais pujantes comércios do
município. Numa hipótese de emancipação a Itinga se constituiria num dos mais
populosos 417 municípios do estado. Muito mais que uma festa de largo, a Festa
do Caranguejo é o momento de celebração de uma comunidade sofrida, mas
batalhadora, que constituiu e continua constituindo um bairro imenso,
totalmente assistido pela Prefeitura de Lauro de Freitas, apesar da proximidade
da Capital de onde nunca usufruiu quaisquer benefícios. Muito pelo contrário,
não só a Itinga, como também Ipitanga, Areia Branca, Barro Duro e Jambeiro,
áreas que também têm sido alvo da cobiça territorial, só contabilizam prejuízos
causados pela capital, como a barulheira dos aviões; os dejetos que poluem os
rios Ipitanga, Itinga, Picuaia e Joanes e a marginalidade que aí se refugia.
O ponto alto da festa que se inicia na sexta-feira à noite, é a lavagem do largo, cujo cortejo sai da concentração em frente à Escola Municipal Senhora Valentina Silvina dos Santos, nome dado em homenagem a uma pioneira da Educação no bairro.
Puxado pelo Bumba-Caranguejo, uma alegoria inédita criada
pelo Portela que a conduz, um carro de mão carregado de caranguejos vivos, o
Afroxé Korin Nagô, autoridades e elas de baianas, a apoteose acontece no
momento da lavagem, juntando uma multidão que se mistura aos blocos e grupos
culturais que surgem de diversos pontos.
Imagem | Blog Catiripapu | Seu Caranguejo com os crustáceos na cabeça https://catiripapu.blogspot.com/2011/06/morre-o-homem-que-deu-nome-ao-largo-do.html |
Faleceu na tarde de 7 de junho de 2011, Antonio Pereira dos Santos, o popular 'Antonio Caranguejo', aos 84 anos...
Na sua 34ª edição, a festa esse ano revestiu-se de um
significado especial quando o povo itingueiro vive um grande momento com a
reabertura do hospital do bairro, fechado na administração passada, a
realização do mutirão de cirurgias, a chegada do Instituto Federal de Educação
da Bahia (IFBA) e outras conquistas, graças ao apoio do governo municipal e
estadual. E mais ainda, diante da tentativa de anexação de parte do bairro à
capital, o sentimento de pertencimento se fazia visível, através de placas,
faixas, camisas, panfletos e gritos que ecoavam em unanimidade: "tenho
orgulho de ser da Itinga! Tenho orgulho de ser de Lauro de Freitas! A Itinga é
nossa!".
Destaque especial da festa foi a presença do homenageado, Lourinho do Fato, comemorando seus 90 anos e junto com a família agradecendo (na ocasião) a prefeita Moema Gramacho e ao Secretário de Cultura e Turismo, Carlucho, pelo reconhecimento, que já se fazia tardio.
Admitir a Itinga como sendo de Salvador seria o mesmo que admitir Jerusalém como a capital de Israel
Historiador e pesquisador Gildásio Freitas, texto publicado no livro "DE IPITANGA A LAURO DE FREITAS: NARRATIVAS HISTÓRICAS DO POVO IPITANGUENSE". O livro disponível na plataforma digital Amazon - https://www.amazon.com.br/Ipitanga-Lauro-Freitas-narrativas-ipitanguense-ebook/dp/B08BTX6RC5
Quem quiser adquirir o livro impresso
(71) 98701-7643 ou 99202-4378
Jornalista com MBA em Comunicação
e Semiótica na linguagem artística
belíssima matéria,eu sou apaixonado pela o bairro itinga aonde moro 20anos!!! Viva à cultura!
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