Troféu Puã - “a cultura é peça chave para transformação”
As nossas entrevistas seguem de forma virtual e desta vez conversei com dois amigos das antigas. Os nossos queridos agitadores culturais, Robinson Brada, 53 anos, servidor público estadual, técnico em meio ambiente e acadêmico em direito. “Cheguei para morar em Itinga no início da década de 70. Tive a oportunidade de ver o crescimento do bairro, o qual não tinha água encanada e nem energia elétrica", rememora Robinson, um dos produtores do inesquecível Troféu Puã.
Puã significa a garra do caranguejo, nome sugestivo e uma referência para os moradores do bairro de Itinga, que carregam com orgulho a história de Seu Caranguejo, que vendia os famosos crustáceos no largo, que com o passar dos anos, aderiu carinhosamente ao nome de Praça do Caranguejo, um importante ponto cultural e uma referência em nossa cidade. Bom, vamos adiante e saber mais um pouco sobre o Troféu Puã, um projeto que marcou a vida cultural de Lauro de Freitas e deixou um legado histórico. Senhoras e senhores, com vocês Robinson Brada e Charles Nobre.
Inquietude cultural...
Robinson - Tínhamos uma equipe inquieta que transformou
a realidade cultural do bairro e posteriormente do município. Criamos a
realização da Trezena de Santo Antônio no Largo do Caranguejo e a Lavagem do
final de linha no Parque São Paulo, onde na sua primeira realização, trouxemos o
Terno de Reis da Fundação Cultural do Estado da Bahia, que encantou todos
moradores pelo colorido, profissionalismo dos atores e bailarinos.
Charles - Robinson é meu amigo e irmão, foi ele que iniciou o processo de observação e me convidou para que a gente pensasse numa forma de destacar algumas figuras da Itinga dentro de um projeto cultural. No ano de 1989 a gente tinha feito uma formação com a juventude através de grupos políticos, culturais e de gincanas.
Uma das coisas que nos incomodava era que Itinga sempre se destacava de forma pejorativa, como um dos bairros mais violentos da Região Metropolitana. Sabíamos que a nossa Itinga era um celeiro cultural, com pessoas boas, trabalhadores e trabalhadoras. Mas a mídia não fazia questão de mostrar o lado positivo e nem os nossos talentos
Charles Nobre
Robison - Realizamos várias reuniões na Escola
Eurides Santana para realização da Primeira Semana Cultural de Itinga,
oportunidade que nasceu um jornal intitulado Nossa Arte. Fui líder de
diferentes equipes Nepotes; Nefastps e Odara, durante as famosas gincanas.
Charles - A gente se reunia na escola e no Largo do Caranguejo, onde chamávamos de umbigo da Itinga. Em um desses encontros, Robinson teve uma sacada genial, de que a boca era a parte mais importante do caranguejo e daí nasceu o Troféu Puã! Um jeito criativo e cultural que encontramos para homenagearmos as pessoas da nossa comunidade.
Qual o nome do filme que você produziu na Ilha?
Robison - O filme a que se refere, foi feito no ano de 1998 em uma viagem com um grupo de frequentadores do Cine teatro de Lauro de Freitas. Fomos para Pirajuia, na Ilha de Itaparica. Estávamos com uma câmera e aí bateu a ideia de fazermos um filme que ironizou a decadência do Conde Drácula, ao chegar no fim de carreira aqui na Bahia e acabou consumindo sangue com dendê. Muita gente assistiu! Fizemos outros com os títulos, “Tieta sua peste” e “Deixa disso que meu filho é Santo”.
Movimento cultural?
Charles - Quando a gente saía á noite existiam vários bares com artistas do bairro se apresentando. Tínhamos poetas, músicos, artistas plásticos, compositores, atores, sambistas, cantores, cantoras e dançarinos. Uma infinidade de pessoas talentosas que se apresentavam por toda comunidade. Éramos e somos até hoje, um caldeirão efervescente de cultura. Precisávamos iniciar um processo para valorizar a nossa gente e os nossos artistas.
Força jovem...
Robinson - Na minha juventude participei ativamente dos movimentos socioculturais, momento em que encontrei a JSB - Juventude Socialista Brasileira, da qual passei fazer parte e ocupei a secretaria do grupo por dois mandatos. Sempre gostei de arte e em todas as suas formas. Ao assistir premiações de categorias artísticas na televisão, veio a ideia de premiar artistas locais e também os comerciantes pelo incentivo cultural e na qualidade dos serviços prestados.
Nasceu o Puã...
Charles - Nasceu em 1990, ano que a gente começou a premiar os nossos artistas em cinco categorias: música, dança, literatura, teatro e artes plásticas, eu acho que tinha também um troféu especial. Tínhamos até o garoto e a garota Puã. O processo de escolha dos destacados se dava a partir dos grupos culturais envolvidos no Puã. Tudo de forma democrática e através do processo de votação. As pessoas votavam e a gente contabilizava e os mais votados eram os premiados.
Troféu Puã...
Robinson - A primeira edição foi em 1990 em um terreno localizado próximo à antiga sede da Coopelotação, aqui em Itinga. Naquela época o coordenador de Cultura de Lauro de Freitas era o Roberto Muniz que percebendo que se tratava de um movimento promissor, nos presenteou com o show de Dado Brasaville na festa de premiação. Pouco tempo depois, fui convidado por Jairo Santos, para ocupar o cargo de secretário administrativo do Cine teatro de Lauro de Freitas, onde ele era o coordenador, órgão da Fundação Cultural do Estado da Bahia, onde permaneci até 2004.
Puã multicultural
Robinson - No ano de 1990 o Troféu Puã passou a
ser uma das atividades do Movimento Cultural Puã, ampliamos sua abrangência com
participantes de outros estados do Brasil. Tivemos a participação de grupos de
teatro de Brasília; São Paulo; Pernambuco e Minas Gerais. Na música, o cantor e
compositor Carlinhos Cor das Águas, havia vencido o Festival Canta Nordeste, conseguimos
traze-lo para ser a atração principal da categoria música. Na dança, fomos
buscar longe o bailarino Armando Pekeno, antigo morador de Itinga, que até
hoje vive e trabalha na Europa, demos a ele uma homenagem especial. Foi
muito rica a festa e com as participações do Balé Folclórico da Bahia e do Olodum.
Charles - Nós estamos falando da década de 1990, quando Lauro de Freitas iniciou o seu processo de desenvolvimento econômico e seu crescimento demográfico. Vislumbrávamos que era necessário desenvolver também a área cultural e do entretenimento. Mas era preciso fazer com que as pessoas compreendessem que o processo cultural faz parte da formação cidadã e do progresso.
Relevância...
Robinson - Em razão do grupo ser criador e se
reunir no Largo do Caranguejo, local que discutíamos políticas públicas culturais, foi que demos o nome Puã, que em tupi-guarani, significa a pata maior do caranguejo. O
Movimento Cultural Puã foi sem dúvida o projeto que deu iniciou ao desperta cultural
no município e logo em seguida vieram outros projetos importantes e com artistas
maravilhosos da nossa terra.
Charles - Realizamos em 1990, 1991 e 1992 aqui em Itinga. Teve um fato marcante de um ex-prefeito da cidade, que recusou a nos apoiar. Erámos jovens precisando de incentivo, mas o tal prefeito foi enfático, “não vou dar dinheiro para machos de graça”. Não abaixamos a cabeça e através de um “Livro de Ouro” arrecadamos doações e fizemos acontecer. Em 1993 o Puã passou a ser municipal e em 1994 estadual. Nos anos de 1995 e 1996, nacional, virando definitivamente "Movimento Cultural Puã".
E uma nova edição?
Robinson - Tudo é possível!
Charles - Existe uma necessidade e uma urgência no surgimento de outros movimentos culturais que possam premiar, reconhecer e homenagear quem faz arte em nossa cidade. É necessário apoiar, incentivar e dar oportunidade para que todos possam continuar a fazer arte em Lauro de Freitas.
Espetáculo realizado por jovens da cidade
A cultura na sua vida?
Robinson - A cultura é peça chave para
transformação de uma sociedade, aconteceu assim no Pelourinho e também na comunidade do Candeal. As
cidades que sabem aproveitar o potencial artístico e cultural, ganham em
todos os aspectos. Essa motivação vem da alma, das formas da natureza e das
grandes obras do teatro, música, poesia, dança e tantas outras áreas que nos
inspiram.
Considerações finais...
Robinson - Deixo bem claro que não fiz todos
esses projetos sozinho, formatávamos uma equipe dedicada, livre para ousar nas
ideias e todos corriam para colocar em prática. Cada edição do Puã era
mais empolgante que a anterior. Quero agradecer toda equipe do Puã e do
Movimento Cultural Puã; Charles Nobre; Jairo Santos; Rosa Gonçalves; Paulo
Aquino; Janeide; Carlos Eduardo; Edson; Sueli Bandeira; Fabio Adorno; Vinicius
Coelho; Elza Borges; Denise Santos; Fabrícia Bispo e os professores das
oficinas.
Charles - Enfim, se eu tivesse que agradecer a todo mundo, seria um dia inteiro somente de agradecimentos, porque foram muitas pessoas que nos ajudaram. Tiveram algumas figuras extraordinárias com quem compartilhei aprendizados e que não saem da minha memória, a exemplo da Marise Berta e Carlos França, figuras que foram importantes neste processo.
Márcio Wesley | DRT/BA 5469
Jornalista com MBA em Comunicação
e Semiótica na linguagem artística |
Licenciando em História
www.blogdomarciowesley.com.br

Troféu Puã. Conheci uma peça muito bonita cujo titular a expôe com a satisfação de ter vencido várias categorias. Trata-se de Pedro Reinaldo da Cruz, o itinguense Mestre Fuscão.
ResponderExcluirLimda matéria, trabalho de ativismo a ser reativado.