Qual o papel do Fazedor de Cultura e do Produtor Cultural?
Nos debates atuais sobre políticas culturais, surgem frequentemente duas expressões que, apesar de relacionadas, representam atuações distintas: fazedores de cultura e produtores culturais. Compreender essas diferenças é essencial para reconhecermos o valor de cada um no amplo leque cultural.
Vamos aqui tentar destrinchar as especificidades desses papéis e suas respectivas contribuições para que possamos entender quem é FAZEDOR DE CULTURA e PRODUTOR CULTURAL.
Fazedores de cultura
Os fazedores de cultura são indivíduos que, de maneira direta e orgânica, produzem manifestações artísticas. São os artistas, músicos, escritores, atores, poetas e demais agentes que criam e expressam arte a partir de sua experiência pessoal e vivências culturais.
Como destacou o professor
e pesquisador Antonio Albino Canelas Rubim: "Os fazedores de
cultura, embora possam atuar em níveis menores de organização, são os
principais responsáveis pela geração da cultura que será distribuída", a
citação aparece na obra Políticas Culturais no Brasil, de sua autoria.
Estes agentes estão frequentemente conectados às suas realidades locais
e são fundamentais para a preservação e renovação de tradições e saberes
populares. Mestres de capoeira, artesãos e músicos que criam suas composições
com base em ritmos populares são exemplos claros desse grupo.
Apesar de sua importância, esses fazedores muitas vezes enfrentam
barreiras para acessar mercados e infraestruturas, mantendo suas produções
culturais em esferas locais e informais.
Produtores culturais
Os produtores culturais, por sua vez, são os responsáveis por viabilizar
o trabalho dos fazedores de cultura. São responsáveis por organizar, gerenciar e estruturar a
produção cultural, garantindo que as criações artísticas cheguem ao público.
Segundo Albino, "os produtores culturais são mediadores e gestores de uma
cadeia que envolve a criação cultural, o mercado e o público".
Esses profissionais trabalham com captação de recursos, desenvolvimento de projetos e negociações com patrocinadores, promovendo o trabalho dos artistas para um público mais amplo. Um exemplo claro é o papel do produtor em conectar o trabalho de músicos ou artistas visuais com festivais, teatros ou galerias, além de lidar com questões burocráticas, como contratos e direitos autorais.
O produtor cultural é responsável por planejar, organizar, executar eventos e projetos artísticos. A produção cultural é essencial para a sobrevivência de áreas como a música, teatro, cinema, literatura e dentre outros gêneros das artes
Enquanto o fazedor de cultura está focado no processo criativo, o produtor cultural se preocupa com a viabilização logística e a econômica da arte.
O renomado antropólogo Néstor García Canclini, reconhecido por seus estudos sobre modernidade e a relação entre cultura, poder e economia, destaca que, "os produtores culturais operam na interseção entre o mercado e a criação, facilitando a transformação da produção artística em algo que pode ser consumido".
Desse modo, Canclini aborda a importância das industrias
culturais e o papel dos produtores culturais como mediadores entre a tradição e
a modernidade, entre o local e o global, entre a arte e o consumo. Tema largamente discutido em seu livro “Culturas
híbridas: estratégias para entrar e sair da modernidade”.
Quilombo do Quingoma: a realidade nas produções culturais em comunidades de nosso país revela que os
fazedores de cultura também assumem o papel de produtores sendo responsáveis
por criar, produzir e promover manifestações artísticas
A confusão entre fazedores de cultura e produtores culturais é comum, especialmente quando os dois papéis se sobrepõem. Muitos fazedores de cultura em nosso pais, por falta de acesso a um produtor, acabam também exercendo a função de organização e gestão de suas próprias criações. Essa sobreposição de funções, pode sobrecarregar e afetar na qualidade de suas criações.
Entretanto, compreender e respeitar as diferenças entre os dois papéis é
fundamental para que os fazedores de cultura tenham o suporte necessário para
focar na criação de suas artes, enquanto os produtores culturais gerenciam a
viabilidade e a promoção do trabalho artístico.
Conclusão
Tanto os fazedores de cultura quanto os produtores culturais são essenciais para a manutenção cultural.
Teixeira Coelho, em sua obra sobre política cultural, resume essa interdependência ao afirmar que, "o fazedor de cultura trabalha movido por um impulso criativo e identitário, mas, para que sua obra alcance o público, o produtor cultural precisa organizar, mediar e negociar com as diferentes esferas do mercado e das políticas públicas".
A produção da cultura hip hop se consolidou buscando cada vez mais espaço no mercado e nas políticas públicas. Este importante movimento multicultural está ligado diretamente com as comunidades, interligado com eventos de rua, festivais, shows e diversas intervenções artísticas
Essas funções, embora distintas, são complementares e essenciais para a perpetuação e disseminação das diversas manifestações culturais que compõem o rico e diverso panorama artístico brasileiro. E compreendermos essas diferenças é um passo essencial para o desenvolvimento de políticas culturais mais inclusivas e eficientes.
Referência bibliográfica
Bourdieu,
Pierre - sociólogo
francês, apesar de não ser brasileiro é largamente citado nos estudos de
política cultural no Brasil. Em sua obra “A Economia das trocas simbólicas”, aborda
a ideia de que fazedores de cultura produzem "capital simbólico",
enquanto os produtores culturais atuam como agentes na transformação desse
capital em valor econômico, social ou cultural.
Canclini,
Néstor García, embora
argentino de nascimento, é referenciado no
Brasil, especialmente em estudos culturais. No livro Culturas Híbridas (2000),
ele discute as relações entre as culturas populares e as novas formas de
produção cultural. Canclini argumenta que, em sociedades complexas, os
fazedores de cultura têm um papel central na criação de identidades, mas, ao
mesmo tempo, precisam estar integrados em um sistema produtivo gerido por
produtores culturais.
Rubim,
Antonio Albino Canelas, um dos principais autores sobre a política e gestão cultural brasileira. Em sua obra "Política Cultural" (2007), afirma: "os produtores culturais são
mediadores e gestores de uma cadeia que envolve a criação cultural, o mercado e
o público. Já os fazedores de cultura, embora possam atuar em níveis menores de
organização, são os principais responsáveis pela geração da cultura que será
distribuída".
Yúdice, George, “A Conveniência da Cultura”, discute o uso da cultura como recurso nas sociedades contemporâneas. Segundo ele, "os produtores culturais operam na intersecção entre o mercado e a criação, facilitando a transformação da produção artística em algo que pode ser consumido. Fazedores de cultura, por sua vez, estão mais preocupados com a autenticidade e a expressão do que com a comercialização".
Márcio Wesley
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